
A literatura é, cada vez mais, um caminho possível para a expressão de outras formas de ser e estar no mundo, já que permitem que as cosmologias e os pensamentos indígenas circulem de forma ampliada entre diferentes gerações, etnias, regiões e países. A leitura dos trabalhos literários das escritoras Márcia Kambeba e Trudruá Dorrico revela a diversidade de vozes indígenas que ressoam no Brasil e, sobretudo, a importância delas serem escutadas para aprendermos a coexistir nessa Terra com seus incontáveis seres, humanos e não humanos.
Esses encontros valorizam a diversidade cultural ao visibilizar os saberes e fazeres de povos indígenas, além de abordar os desafios e processos de fortalecimento cultural decorrentes da escolha de registrar seus conhecimentos por meio da escrita alfabética.
Valorizar a ancestralidade nacional – e, neste caso, a literatura indígena – é um problema que perdura nos dias atuais. Isso porque, em geral, não se aprende sobre cultura indígena nas escolas do País. Ao longo dos anos, os processo de colonização, escravização, genocídio e etnocídio das nações originárias brasileiras foram esquecidos – e é a partir dessas problemáticas que Kambeba e Dorrico pretendem abordar, no Flitabira, justamente como forma de resgate da valorização indígena.
Diante disso, o Flitabira conta com uma palestra entre as escritoras indígenas Márcia Kambeba e Trudruá Dorrico, que será realizada no dia 3/11, sexta-feira, às 19h. O poema de Drummond que norteia a conversa é “Pranto geral dos índios” – leia-o abaixo:
Pranto geral dos índios
Chamar-te Maíra
Dyuna
Criador
seria mentir
pois os seres e as coisas respiravam antes de ti
mas tão desfolhados em seu abandono
que melhor fora não existissem
As nações erravam em fuga e terror
Vieste e nos encontraste
Eras calmo pequeno determinado
teu gesto paralisou o medo
tua voz nos consolou, era irmã
Protegidos de teu braço nos sentimos
O akangatar mais púrpura e sol te cingiria
mas quiseste apenas nossa fidelidadeEras um dos nossos voltando à origem
e trazias na mão o fio que fala
e o foste estendendo até o maior segredo da mata
A piranha a cobra a queixada a maleita
não te travavam o passo
militar e suave
Nossas brigas eram separadas
e nossos campos de mandioca marcados
pelo sinal da paz
E dos que se assustavam pendia o punho
fascinado pela força de teu bem querer
Ó Rondon, trazias contigo o sentimento da terra
Não nos deixaste sós quando te foste
Ficou a lembrança, rã pulando n’água
do rio da Dúvida: voltarias?
Amigos que nos despachaste contavam de ti sem luz
antigo, entre pressas e erros, guardando
em ti, no teu amor tornado velho
o que não pode o tempo esfarinhar
e quanto nossa pena te doía
Afinal já regressas. É janeiro
tempo de milho verde. Uma andorinha
um broto de buriti nos anunciam
tua volta completa e sem palavra
MÁRCIA KAMBEBA
Márcia Kambeba é escritora, poeta, compositora, educadora, tem 5 livros publicados de poesia, contos e infantil. De formação, tem mestrado em Geografia e faz doutorado em Estudos Linguísticos/UFPA. Faz parte da Academia Formiguense de Letras, em Minas Gerais, e da Academia Internacional de Literatura Brasileira nos EUA. Também é roteirista e representou o olhar indígena na segunda temporada da série “Cidade Invisível”, produzida pela Netflix. Junto a Rita Carelli e Murilo, roteirizou o espetáculo musical “Amazônias: ver a mata que te vê”. Também é atriz, cantora e compositora de música indígena e amazônica. Performa suas composições e recita em sarau suas produções escritas, levando a arte como ato político, democrático e decolonial, além de contribuir com a educação e o humanismo nos espaços dentro e fora das aldeias.
TRUDRUÁ DORRICO
Trudruá Dorrico pertence ao povo Makuxi. Doutora em Teoria da Literatura na PUC-RS, é escritora, artista, palestrante e pesquisadora de literatura indígena. Venceu em 1.º lugar o concurso Tamoios/FNLIJ/UKA de Novos Escritores Indígenas em 2019. Administradora do perfil @leiamulheresindigenas no Instagram. Curadora da I Mostra de Literatura Indígena no Museu do Índio (UFU). Autora da obra “Eu sou Macuxi e outras histórias” (Caos e Letras, 2019). Curadora do FeCCI – I Festival De Cinema Indígena, Brasília (2022). Foi residente no Cité Internationale des Arts, Paris (2023). Atualmente está no pós-doutorado do Programa de Desenvolvimento da Pós-Graduação Emergentes e em Consolidação PDPG – Pós-Doutorado Estratégico/UFRR (2023-2024).
SOBRE O FLITABIRA
Criado pelo jornalista Afonso Borges – que é também o idealizador do Festival Literário de Araxá (Fliaraxá) e do Sempre um Papo –, o Flitabira realizará sua terceira edição entre os dias 31 outubro e 5 de novembro de 2023, celebrando 121 anos de nascimento do poeta Carlos Drummond de Andrade. As atividades acontecem tanto de forma presencial, na Praça do Centenário, quanto on-line, pelo canal no YouTube do Festival.
O Flitabira tem o patrocínio do Instituto Cultural Vale, via Lei de Incentivo à Cultura, a Lei Rouanet, do Ministério da Cultura, com o apoio da Prefeitura de Itabira e União Brasileira de Escritores – UBE.
INSTITUTO CULTURAL VALE
O Instituto Cultural Vale parte do princípio de que viver a cultura possibilita às pessoas ampliarem sua visão de mundo e criarem novas perspectivas de futuro. Tem importante papel na transformação social e busca democratizar o acesso, fomentar a arte, a cultura, o conhecimento e a difusão de diversas expressões artísticas do nosso País, ao mesmo tempo em que contribui para o fortalecimento da economia criativa. São mais de 300 projetos criados, apoiados ou patrocinados em 24 estados e no Distrito Federal em execução em 2023. Dentre eles, uma rede de espaços culturais próprios, patrocinados via Lei Rouanet, com visitação gratuita, identidade e vocação únicas: Memorial Minas Gerais Vale (MG), Museu Vale (ES), Centro Cultural Vale Maranhão (MA) e Casa da Cultura de Canaã dos Carajás (PA). Onde tem Cultura, a Vale está. Visite o site do Instituto Cultural Vale: institutoculturalvale.org.
SERVIÇO:
III Flitabira – Festival Literário Internacional de Itabira
De 31 de outubro a 5 de novembro
Local: Praça do Centenário (Rua Maj. Lage, 121 – Centro Histórico)
Informações: www.flitabira.com.br
Informações para a imprensa: info@flitabira.com.br